A questão do acesso ao
ensino superior, no Brasil, pressupõe uma breve incursão na história da
educação superior no sentido de identificar e delimitar alguns marcos
significativos de sua trajetória, posto que direta ou indiretamente
concorreram eles para o delineamento da atual configuração das universidades
brasileiras. De início, é importante destacar que o país nunca teve um
modelo próprio de universidade, valendo-se sempre de exemplos e de
experiências de países centrais, podendo-se constatar, nos dias atuais,
uma superposição de modelos entre as IES públicas e privadas.
Desde o seu advento, a
educação superior, no país, esteve voltada para os filhos das famílias da elite
social e econômica. No Brasil Colônia, os jovens eram enviados para
estudar nas universidades europeias, especialmente, em Coimbra, Portugal.
Com raras exceções, alguns jovens vindos de famílias menos favorecidas
conseguiam frequentar cursos superiores por meio do ingresso na vida religiosa
e, portanto, com o apoio da Igreja. Por volta de 1808, com a chegada da
Corte portuguesa, registra-se a criação das primeiras escolas isoladas de
educação superior, no país, concebidas à luz do “modelo
napoleônico”, centrado em cursos e faculdades, estruturados de forma
independente e não propriamente a partir da concepção de universidade. O
“modelo”, centralizado do ponto de vista administrativo, mas dissociado
em relação à integração das faculdades, via no ensino superior um
importante mecanismo para formar os profissionais necessários ao
funcionamento da sociedade e, ao mesmo tempo, um importante
instrumento para disseminar as doutrinas vigentes (TRINDADE, 1998). Esses
cursos e faculdades se destinavam principalmente à formação dos quadros
necessários à burocracia do Estado, em consonância com as
suas doutrinas.
Vale destacar que o
Brasil esteve fora do debate sobre um novo projeto de universidade empreendido
por países europeus, posto que somente em 1920, portanto, bastante
tardiamente (CUNHA, 2007), é criada a Universidade do Rio de Janeiro,
efetivamente a primeira do país, que incluía uma confederação de escolas –
Medicina, Politécnica e Direito (FÁVERO, 1999). Alguns anos mais tarde, em
1927, é inaugurada a Universidade Federal de Minas Gerais, à luz do modelo
neonapoleônico, aglutinando cinco faculdades – Engenharia, Medicina,
Direito, Farmácia e Odontologia. Tratava-se de um modelo de
administração centralizada, que pressupunha alguma coordenação em relação
aos cursos de formação profissional. Na prática, esses cursos - concebidos
sob a ótica da ciência positivista que delimita rigidamente os campos
de conhecimento - se apresentavam desintegrados e independentes
(ANASTASIOU, 2001). Até hoje, esse modelo de inspiração napoleônica
influencia as universidades brasileiras tanto em relação à oferta
de cursos e programas, quanto ao não incentivo ao desenvolvimento de
processos divergentes de pensamento.
No contexto da “revolução
de 1930”,
são registrados dois projetos de universidade com propostas assemelhadas:
o da Universidade de São Paulo (USP), em 1934, e o da Universidade do Distrito
Federal (UDF), em 1935. Em que pese, na UDF, as idéias
liberais-progressistas de seus mentores quanto à criação de uma
instituição autônoma, responsável pela produção do “saber desinteressado” e
pela formação de indivíduos críticos e “cultores da liberdade”, a proposta
não se consolida em razão de pressões de segmentos conservadores da
sociedade, entre eles, a Igreja e o próprio Estado, que a consideravam uma ameaça
à sociedade. Na USP, é criada a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras como
um “centro integrado de busca e de crítica do saber”, sob a inspiração do
modelo germânico humboldtiano, pautado na concepção da indivisibilidade
entre o saber, o ensino e a pesquisa (TRINDADE, 1998). A proposta
sofre oposição das demais instituições superiores de formação profissional
(Direito, Engenharia, Medicina e Agricultura) cuja autonomia, estrutura,
mentalidade e tipo de ensino certamente sofreriam limitações sob essa nova
concepção de universidade. Por quase três décadas, de 1934 a 1959, a Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras resiste às pressões tal qual “um estado
dentro do estado”, mas, desprovida de poder político, a proposta acaba por
se descaracterizar e se tornar impraticável. Nessas condições, a
Universidade paulista sobrevive como uma federação de escolas,
incorporando, pois, traços do modelo napoleônico profissional (SGUISSARDI,
2004).
No início dos anos de
1960, as várias correntes da intelectualidade brasileira e os estudantes
discutem uma nova proposta de universidade para o país em meio a um
crescimento espontâneo e desordenado das IES. Em 1962, é fundada a
Universidade de Brasília (UnB) que, considerada um “projeto coletivo da intelectualidade
brasileira”, reacende a idéia de um modelo de universidade baseado na
associação do ensino e da pesquisa e de uma estrutura integrada por meio
da coordenação das atividades das várias unidades de ensino. Vista como
uma inovação face ao modelo tradicional baseado em faculdades e
escolas independentes e consideradas auto-suficientes, a experiência da
UnB foi logo abortada pelo golpe militar de 1964. Considerada foco de
deliberação de idéias subversivas, seus idealizadores foram demitidos e muitos deles
obrigados a se exilar no exterior. Inúmeros professores foram detidos e outros
se demitiram em sinal de protesto contra a intervenção militar (CUNHA,
2007).
Ainda, no início da década de 1960, o movimento dos estudantes
liderado pela União Nacional dos Estudantes (UNE) defendia uma reforma
universitária como parte das Reformas de Bases defendidas pelos setores
progressistas do país. Uma das principais bandeiras de luta dos estudantes era
a democratização da universidade, traduzida principalmente pela
democratização do acesso ao ensino superior, o que deveria ocorrer pela
ampliação do número de vagas, pela rediscussão dos exames vestibulares, entre
outros aspectos (SGUISSARDI, 2004). Tal
qual aconteceu com os gestores e docentes da UnB, também alguns estudantes
foram exilados, outros detidos e torturados, sob a acusação de conspirarem
contra a ordem estabelecida pelo novo regime do país.
Em 1968, o governo
militar implanta a Reforma Universitária por meio da Lei 5.540, sob inspiração
do acordo entre o Ministério da Educação e Cultura (MEC) e a United States
Agency for International Development (USAID), que impunha diretrizes à
produção do conhecimento e ao processo de pesquisa a serem realizados
pelas universidades brasileiras. A legislação da ditadura militar rompe com o
modelo neohumboldtiano na medida em que a responsabilidade pelo desenvolvimento
de pesquisas passa a ser da pós-graduação, enquanto que à graduação
caberia a formação dos quadros de profissionais especializados para
atender às demandas do “modelo” econômico então denominado de milagre
brasileiro. Com foco no mercado e a cisão entre ensino e pesquisa, no
âmbito da graduação e da pós-graduação, que leva a uma quase estagnação do
processo de criticidade no âmbito dos cursos de graduação, a Reforma resgata
o caráter arcaico do modelo napoleônico (ANASTASIOU, 2001).
Uma avaliação dos vinte
anos que se seguiram à implantação da Reforma indicam, de um lado,
a consolidação da pós-graduação e a estruturação da carreira docente nas
universidades federais e, de outro, a não efetivação do propósito de
consolidação de um modelo de universidade para oferta da
educação superior, haja vista a ampliação das IES isoladas ou aglutinadas
em federações (VIEIRA, 1991).
É importante destacar
que, desde meados dos anos de 1990, o Estado vem incentivando e
criando facilidades para a abertura e expansão de IES privadas. Em
contrapartida, tem restringido o apoio à manutenção e expansão do setor
público federal, que também não goza de autonomia administrativa e financeira
sobre seu orçamento. As IEs privadas se concentram sobretudo na região Sudeste
onde, entre outros fatores, é maior a demanda de alunos, de renda e de
lucro. Entre 1994 e 2000, verifica-se um aumento de 38% de IES, no país,
montante em que as privadas apresentaram um crescimento de 58%, enquanto
que as públicas apresentaram uma diminuição de 23% (SGUISSARDI, 2004).
A partir de meados dos
anos de 1990, a
legislação federal por meio dos Decretos N° 2207 e N° 2306 de 1997 e N°
3.860 de 2001, concebidos sob inspiração neoliberal e influência efetiva do
Banco Mundial, estabelece que a indissociabilidade entre ensino, pesquisa
e extensão se aplica apenas às universidades, deixando desobrigadas as
IES, o que contraria o artigo 207 da Constituição Federal, que estabelece
o vínculo entre as três instâncias. Tal situação dá indícios da existência
de uma superposição ou dualidade de modelos de universidades (SGUISSARDI,
2004).
Em 2000, de um total de
1.180 IES, no país, apenas 71 eram públicas, as demais assim se dividiam:
884 IES isoladas, 140 Centros Universitários e/ou Faculdades Integradas e
85 universidades privadas, em que mais de 60% tinham fins lucrativos.
Nesse contexto, é bem provável que a maior parte delas, com
raras exceções, se inclua no modelo neo-napoleônico haja vista a não
obrigatoriedade de apresentar uma estrutura consolidada de pesquisa e de
associar ensino, pesquisa e extensão. Desse grupo, certamente ficariam de
fora as IES públicas e algumas privadas que, conforme o modelo neo-humboldtiano,
deveriam atender os requisitos necessários para a produção do conhecimento
oriundo da pesquisa (SGUISSARDI, 2004). Para não se cair ingenuidade de um
raciocínio maniqueísta, é bem provável que os dois modelos convivam ou
estejam superpostos em uma mesma instituição.
Nesse contexto, Trindade (1998) nos chama a atenção para a crise da
universidade que, para além do público e do privado, é a crise da
instituição na atual sociedade do conhecimento cuja ênfase é dada
à formação de profissionais polivalentes para o mercado. Também Sguissardi (2004) nos chama a atenção para um modelo emergente de
universidade “pública” e privada, que denomina de
neoprofissional, heretônomo e competitivo. A característica neoprofissional se revela, entre outros fatores,
pelo aumento do número de IES particulares e pela evolução de seu número
de matrículas, na ordem de 121%, entre 1994 e 2000 contra 36% nas
públicas, o que indica um crescimento das universidades ditas profissionais
em relação às universidades que associam ensino e pesquisa. A heteronomia
diz respeito à redução da autonomia das universidades, especialmente nas
públicas federais, em que a prática estaria cada vez mais submissa à
lógica do mercado e do Estado. A competitividade não se restringiria ao tipo de
gestão assumido pelas IES particulares, ou seja, de uma empresa
tipicamente comercial, mas, sobretudo, como parte do problema econômico do
país em que a educação superior é considerada fator de competitividade no
mundo globalizado.
A despeito dos modelos de
universidade encontrados no cenário brasileiro, é importante destacar que
a educação superior continua sendo um segmento educacional voltado a uma
minoria, haja vista os dados do último censo nacional de 2000. De uma
população de 170 milhões de habitantes (86 milhões feminina e 84 milhões
masculina), menos de 5%, isto é, 5.890.631 (2.689.726 homens e 3.200.905
mulheres) teve acesso ao ensino superior e, desse montante, apenas
5.485.710 tinham completado cursos de graduação e, somente, 302.043 tinham
diplomas de pós-graduação (Mestres e Doutores).
É nesse contexto que se
insere a discussão sobre o acesso ao ensino superior temática que envolve não
só os estudos das políticas públicas e dos mecanismos que levam à tomada
de decisão, como também suas implicações nos modelos de avaliação em
educação.
Os programas de acesso ao
ensino superior inserem-se no âmbito das políticas inclusivas
compensatórias posto que visam corrigir as lacunas deixadas pelas
insuficiências das políticas universalistas. Esses programas, como destaca
Cury (2005), buscam equilibrar uma situação sempre que a balança tende
a favorecer grupos hegemônicos no acesso aos bens sociais, conjugando, ao
mesmo tempo, os princípios de igualdade com o da eqüidade, compreendida
como a melhor escolaridade. Buscam também atender à dimensão de uma
inserção profissional mais qualificada mediante uma base maior de inteligência,
visando ao desenvolvimento científico e tecnológico do país.
Dentre as políticas que
têm o foco no acesso ao ensino superior destacam-se o Programa
de Financiamento Estudantil (FIES) e o Programa Universidade para Todos
(PROUNI). Voltados para a população de baixa renda, são considerados
políticas inclusivas, compensatórias, focalizadas e afirmativas. Ao
priorizar a análise do PROUNI, o pressuposto deste estudo é que este Programa,
ao mesmo tempo em que produz mudanças tanto para a IES como para os alunos
bolsistas, é um desdobramento das políticas públicas focalizadas e de
caráter compensatório. Considerando as regras que garantem a participação
de pessoas de diferentes etnias, a proposta do PROUNI pode também ser
identificada como uma ação afirmativa. Integra o escopo do trabalho a
análise sobre as relações entre o público e o privado no âmbito
do Programa.
POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A
EDUCAÇÃO SUPERIOR E A EMERGÊNCIA DO PROUNI
A definição e
implementação de uma política de acesso à universidade integram um rol de
demandas oriundas, em larga medida, do cenário produtivo. A solicitação de
uma força de trabalho mais qualificada e apta a “aprender a aprender” e a
responder às qualificações que vão sendo forjadas, desenvolvendo
novas competências exigidas para a vida na sociedade contemporânea, em
contraposição aos requerimentos colocados pelo modelo taylorista/fordista,
são elementos que permeiam a proposição das políticas de educação. A
solicitação do cumprimento de funções mais cerebrais como raciocínio lógico,
resolução de questões surgidas no cotidiano do trabalho, disposição de
estar sempre aprendendo, e a cobrança de um novo padrão atitudinal, qual
seja, uma força de trabalho mais cooperativa, autônoma e comunicativa,
são aspectos que se coadunam com a ampliação da escolaridade. À educação é
atribuído o papel estratégico de promover o desenvolvimento das novas
capacidades requeridas do trabalhador.
A discussão sobre a
emergência e implantação do PROUNI no quadro das políticas públicas de
educação superior nos conduz a recuperar não apenas questões ligadas à
definição, manutenção e/ou (re)direcionamento das políticas em curso, mas
possibilita reconstruir, mesmo que parcialmente, suas ligações com as
concepções neoliberais. Nesse sentido, é preciso considerar que, desde meados
da década de 1970, o quadro sócio-político e econômico do país provocou
mudanças na definição do caráter das políticas públicas, na relação entre
o público e o privado e nos debates sobre a redefinição do papel
do Estado, tocando na problemática do emprego e desemprego. Ao mesmo
tempo, esses temas ganharam destaque nos debates e proposições feitas por
agências multilaterais e organismos internacionais e permanecem presentes
nos debates de diferentes setores e segmentos da sociedade, interagindo com
as políticas educacionais, sobretudo nos países em desenvolvimento.
Em decorrência das
solicitações que emergem desse cenário em contínua mudança, definiram-se
vínculos quase lineares entre a escolaridade da população e a sua
capacidade de inserção e permanência no mercado de trabalho, bem como com
o seu desempenho produtivo. Trata-se de novas solicitações feitas à educação
e à escola, aos trabalhadores, tendo em vista a busca de maior produtividade,
qualidade e competitividade, marcas de uma economia globalizada. Esse
processo de mudanças, associado a uma grande discussão sobre o papel do
estado e à crise do welfare state, foi um dos pilares da constituição
de uma agenda de reformas, sob inspiração neoliberal. O cenário
brasileiro, no final da década de 1970 e início dos anos de 1980, foi
marcado por duas tendências complementares e, muitas vezes conflitantes:as conseqüências das medidas de caráter neoliberal,
identificadas por medidas de ajuste estrutural, e os processos de
redemocratização, com a implementação de inúmeras reformas.
O papel do Estado em um
contexto de ajustes estruturais está estreitamente relacionada aos lemas definidos
pelas agências multilaterais em relação às políticas públicas - focalizar,
descentralizar e privatizar - temas presentes nos debates sobre as
políticas públicas na década de 1990 e, também, no quadro atual.
Um exame dos programas e
recomendações das agências multilaterais, como o Banco Mundial, ou
de projetos e políticas elaborados por vários governos, mostra a
preocupação com esses temas. Segundo essas agências, uma política focaliza
e racionaliza a alocação de recursos e os resultados são rapidamente visíveis.
Autores críticos desses princípios consideram que a política de focalização, em
contraposição às políticas universalistas apresenta [ ] várias
vantagens para as elites conservadoras, que geralmente conduzem as reformas.
Em primeiro lugar os benefícios focalizados reduzem custos; os
setores no extremo da pobreza são conquistáveis com recursos limitados.
Afinal, pobre custa pouco, muito pouco. Em segundo lugar, racionalizam a
velha política de clientela. Benefícios dirigidos e particularizados não
correm o risco político de serem confundidos com medidas que
criam direitos universais ou bens públicos, sempre submetidos, estes
últimos, a demandas de extensão e generalização. Permitem também a
distribuição mais discricionária dos recursos.
Além de seletivos (e por
causa disso), têm mais chance de impor condições à concessão, dando forma
mais clara às manifestações de gratidão dos beneficiados (MORAES,
2001, p.66).
A política pública, ao
focalizar grupos, recursos e benefícios, substitui a política de acesso
universal pelo acesso seletivo, posto que:
O acesso universal faz com que os serviços sejam considerados
direitos sociais e bens públicos. O acesso seletivo permite definir mais
limitadamente e discriminar o receptor dos benefícios. [ ] As
políticas sociais do neoliberalismo, por sua vez, aproximam-se cada
vez mais do perfil de políticas compensatórias, isto é, de políticas que
supõem, como ambiente prévio e ‘dado’, um outro projeto de sociedade
definido em um campo oposto ao da deliberação coletiva e de planificação.
O novo modelo de sociedade é definido pelo universo das trocas, pela mão
invisível do mercado (MORAES, 2001, p.66).
Ao focalizar grupos
específicos, o modelo preconiza a idéia de “dar a quem mais precisa”,
compensando ou reparando seqüelas do passado, idéia presente desde a
Antiguidade Clássica que destacava o “tratar desigualmente os desiguais”
(CURY, 2005, p.15). Esse tema associa-se aos pressupostos que orientam
as ações afirmativas, uma vez que tais ações planejam e atuam no sentido
de promover a representação de grupos inferiorizados na sociedade e lhes
conferir uma preferência para assegurar seu acesso a determinados bens,
econômicos ou não (MOEHLECKE, 2002, p.200).
Outro aspecto a ser
destacado refere-se ao crescimento das ações sociais e de caráter público no
âmbito da iniciativa privada, entre elas, iniciativas privadas no campo da
educação básica pública como a “adoção” 8 de escolas públicas e as
parcerias entre as empresas e as escolas, que já contam com muitos adeptos
e reiteram o pressuposto neoliberal sobre a inoperância/insuficiência do
Estado na gestão escolar. Esse quadro, de certo modo, nos remete à idéia
de privatizar, presente nas políticas públicas do contexto neoliberal –
que pode ser feita pela transferência ao setor privado da propriedade dos entes
estatais (inclusive os entes provedores de políticas sociais, tais como
saúde, educação, moradia, assistência social, etc.), bem como pela
transferência da operação e/ou gestão destes serviços (MORAES, 2001, p.67).
A redução da capacidade de investimento do Estado na educação
superior e outras mudanças, como a interrupção do processo de expansão
física da rede federal de ensino superior, em curso, até o final da década
de 1970, com repercussões em sua oferta, produziram resultados que vieram
reforçar as idéias de focalização e privatização acima destacadas,
permeadas pela emergência das ações afirmativas. O foco definido para as
políticas públicas do projeto neoliberal foi a educação básica, face a pressão
social pela expansão e melhoria desse nível de ensino.
No final dos anos de
1980, no governo Collor, as análises sobre o ensino superior destacam o
que consideram suas distorções: formação de profissionais desvinculada da
geração de riquezas; insuficiente formação na área de ciências exatas e
gasto excessivo, em detrimento dos demais níveis de ensino. Para dar conta
dessas distorções, foram estabelecidas algumas metas: ampliação do acesso;
respeito à autonomia universitária; maior estímulo ao desenvolvimento de
pesquisas entre universidades e empresas; ampliação dos programas de
pós-graduação; capacitação e valorização dos profissionais de educação.
No entanto, o que ocorreu foi o estabelecimento de medidas de
favorecimento à expansão do ensino superior privado, situação que se
consolidou ao longo dos governos Fernando Henrique Cardoso (1994 –
2002), quando foram acelerados e facilitados os processos de autorização,
reconhecimento e credenciamento de cursos e instituições pelo Conselho
Nacional de Educação (CNE) (CORBUCCI, 2004).
Em síntese, dentre os fatores responsáveis pelo avanço do setor
privado, no campo da educação superior, destacam-se as imposições do
ajuste fiscal dos anos de 1990, momento em que o governo federal
não demonstrou capacidade para ampliar os gastos com a educação superior,
assumindo o compromisso com a educação básica.
Embora, em 2002, 70% do
total das matrículas do ensino superior estivesse concentrado no setor privado,
o modelo de expansão do ensino superior proposto na década de 1990, centrado
na iniciativa privada, mostrou limites que poderão comprometer, em breve,
a própria sustentabilidade da oferta, tendo em vista a baixa capacidade de
demanda da sociedade e dos índices de inadimplência dos estudantes
matriculados nas instituições privadas. Ou seja, a simples ampliação da
oferta de vagas não é condição suficiente para a democratização do acesso
ao ensino superior (CORBUCCI, 2004, p.684, 687).
Para preencher as vagas
ofertadas pelas IES privadas, foi criado o Fundo de Financiamento do Ensino Superior
(FIES), em 1999 pelo Governo Federal, com o objetivo de ser auto-sustentado,
substituir o Programa de Crédito Educativo (PCE/CREDUC) e financiar o
ensino superior de estudantes sem condições de arcar os custos de sua
formação, que estivessem regularmente matriculados em instituições
privadas cadastradas no Programa e com avaliação positiva nos processos
conduzidos pelo MEC. O FIES tem registrado uma participação cada vez maior
das IES e dos estudantes do país. Os números do processo seletivo do segundo
semestre de 2006, mostram que participam do FIES 1.110 mantenedoras, 1.513
IES, 2.059 campi, 23.035 cursos/habilitações, além de 449.786
estudantes beneficiados. No entanto, o FIES não consegue absorver a
demanda e sequer atinge 10% do total de alunos matriculados no setor
privado. Mesmo assim, as análises centradas no FIES devem levar em
consideração os eixos que passaram a nortear as políticas públicas a
partir de meados da década de 1990, principalmente a idéia de focalização.
A partir de 2005, o FIES
passou a conceder financiamento também aos estudantes selecionados
pelo PROUNI para recebimento da bolsa parcial de 50%, regularmente
matriculados em cursos de graduação. O FIES pode ser utilizado por estes
estudantes para pagamento de 25% do valor da mensalidade. Concebido em
2004, no âmbito do governo federal, e implementado em 2005, o PROUNI visa criar
condições para o acesso de estudantes carentes ao ensino superior, por
meio da oferta de bolsas de estudo, de diferentes modalidades, para
instituições mantidas por iniciativa privada. Os bolsistas parciais do PROUNI
não participam dos processos seletivos regulares do FIES, sendo designados
períodos específicos para concessão do financiamento.
Em 2003, no início da
gestão do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o MEC desencadeou o processo
de Reforma da Educação Superior, visando: democratizar o acesso ao ensino
superior; inserir a universidade no projeto de desenvolvimento nacional;
refinanciar a universidade pública; transformar a universidade pública em
referência para toda a educação superior; estabelecer nova regulação entre os
sistemas público e privado. O PROUNI, uma das primeiras iniciativas no
âmbito da Reforma, pode ser analisado como desdobramento da relação posta
aos setores público e privado, como uma política focalizada, de
caráter compensatório e, de certa forma, como uma ação afirmativa.
O Programa Universidade
Para Todos – PROUNI no campo das políticas públicas
Instituído em setembro de
2004, o PROUNI visa criar condições para o acesso de estudantes carentes
ao ensino superior, por meio da oferta de bolsas de estudo, de diferentes
modalidades: bolsa de estudo integral concedida a brasileiros não
portadores de diploma de curso superior, cuja renda per capita não exceda o valor
de até um salário mínimo e meio; bolsa de estudo parcial de cinqüenta por cento
concedida a brasileiros não portadores de diploma de curso superior, cuja
renda familiar per capita não exceda o valor de até três salários mínimos.
Implantado em 2005, o
PROUNI insere-se em um contexto no qual apenas 13% dos jovens de 18 a 24 anos estão
matriculados em IES, segundo dados da Pesquisa Anual por Amostra de Domicílios,
PNAD (2003).
No conjunto dos países da América Latina, o Brasil apresenta um dos
mais baixos índices de acesso, comparado com a Argentina (cerca de 40%),
Venezuela (26%) e Chile (20,6%). Tal situação se configura como
particularmente desafiadora quando se toma como referência a meta definida pelo
Plano Nacional de Educação de 2001, que propõe prover até o final da
década a oferta de educação superior para, pelo menos, 30% da faixa etária
de 18 a
24 anos.
Além da renda per
capitaI, os critérios que norteiam a inscrição do aluno no PROUNI para
concorrer a uma
bolsa de estudos são os
seguintes: ter participado do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) em
2002, 2003, 2004 ou 2005; ter cursado o ensino médio completo em escola
pública; ter cursado o ensino médio completo em instituição privada com
bolsa integral; ser portador de necessidades especiais; ser professor da
rede pública de educação básica, no efetivo exercício do magistério, integrando
o quadro de pessoal permanente da instituição, desde que esteja buscando
complementar sua formação em cursos de licenciatura ou de Pedagogia. Nesse
último caso, não é necessária a comprovação de renda familiar per capita
estipulada.
As inscrições para o
processo seletivo do PROUNI são efetuadas por meio eletrônico e cabe à
IES credenciada oferecer acesso à internet aos candidatos. Ao aderir ao
PROUNI, a IES deve conceder uma bolsa de estudo para cada nove alunos
regularmente matriculados e, no caso da IES beneficente, o percentual é de
uma bolsa para cada quatro alunos matriculados. A concessão de bolsas está
limitada a 10% do total de matriculados, devendo a IES atentar para a
proporcionalidade em relação aos cursos oferecidos, turnos e unidade
administrativa. O processo de seleção de bolsistas deve beneficiar,
também, negros e indígenas em igual proporção à sua participação no
conjunto populacional, razão para que o Programa seja identificado como
ação afirmativa.
As primeiras análises do
governo federal são otimistas. No primeiro semestre de 2005, o Programa
colocou à disposição 112 mil bolsas de estudos em universidades privadas,
sendo 72 mil bolsas totalmente gratuitas. Com essa medida, o governo
ampliou em 60% a oferta do ensino superior gratuito em apenas
um ano.
O quadro a seguir mostra
a distribuição de bolsas ofertadas pelo PROUNI ao longo de sua existência;
Número de bolsas
ofertadas pelo PROUNI – 2005-2007
Ano Número de bolsas
Integral Parcial Total
2005 71.905 40.370
112.275
2006 (1º semestre) 63.536
28.093 91.609
2006 (2º semestre) 36.162
11.897 47.059
2007 (1º semestre) 65.276
43.366 108.642
2007 (2º semestre) 32.355
22.857 55.212
Total 269.234 146.583
415.817
Fonte: MEC, 2008
Para além das bolsas de
estudo, integrais ou parciais, o governo federal autorizou, por meio da
Medida Provisória 251 de 2005,
a concessão da bolsa permanência, no valor de R$ 300,00
(trezentos reais) mensais, exclusivamente para o pagamento de despesas
educacionais, para estudantes beneficiários de bolsa integral,
matriculados em turno integral. Os estudantes que receberam bolsa parcial podem
recorrer ao Fundo de Financiamento do Ensino Superior (FIES). A adesão ao
PROUNI permite a IES a isenção do recolhimento de impostos e tributos
incidentes sobre as receitas provenientes das atividades desenvolvidas na
educação superior (CORBUCCI, 2004, p.694).
O PROUNI como política
focalizada e compensatória, prática privatista e ação afirmativa
Ao proporcionar condições
para o acesso de estudantes carentes ao ensino superior privado, por meio
da oferta de bolsas de estudo, o PROUNI define como focos de atuação um
nível de ensino, o superior, e um segmento expressivo de jovens das
camadas populares, egressos de ensino médio oferecido em escolas públicas.
O PROUNI como política
focalizada e compensatória
Apresenta-se como
estratégia voltada para a “focalização” dos direitos de grupos marcados por
carências econômicas e pela vulnerabilidade social. De certo modo, as
políticas focalizadas visam corrigir as lacunas deixadas pelas
insuficiências das políticas universalistas.
Sobre o alcance das
políticas focalizadas, Cury (2005) destaca que buscam equilibrar uma situação
sempre que a balança tender a favorecer grupos hegemônicos no acesso aos
bens sociais, conjugando ao mesmo tempo, por justiça, os princípios de
igualdade com o de equidade. Ao apontar para a ampliação da escolaridade
em nível superior, a política focalizada pretende atender também às solicitações
de uma inserção profissional mais qualificada, contribuindo para o
desenvolvimento científico e tecnológico do país e para uma melhor
distribuição de renda. Contudo, essas ações focalizadas no ensino superior se
dão em um cenário em que os desafios da educação básica persistem, em que
pesem as políticas direcionadas das últimas décadas.
Estudos recentes sobre
acesso à educação em diferentes faixas etárias revelam que, apesar do
significativo crescimento das matrículas e dos índices de conclusão nos
ensinos fundamental e médio, decorrentes de políticas de expansão e
correção de fluxo, apenas cerca de 27% dos jovens com idade de 18 a 24 anos concluíram o
ensino médio. Assim, são poucos os que possuem, do ponto de vista do nível
de escolarização alcançado, os requisitos formais para acesso ao ensino
superior (ANDRADE e DACHS, 2006).
Por outro lado, a
expansão do atendimento não se fez acompanhar de uma oferta de ensino com o
nível de qualidade esperado. Nas avaliações de âmbito nacional prevalecem
o desempenho insuficiente dos alunos do ensino médio no que se refere ao
domínio de conhecimentos básicos para a inserção social e no
mundo produtivo. Isto significa que as responsabilidades do Estado com a
expansão e a qualidade da educação básica continuam a exigir toda a
atenção por ser esta a base indispensável para políticas dirigidas ao
ensino superior. Em 2003,
a rede pública de ensino era responsável pelo
atendimento da grande maioria dos estudantes, com uma cobertura
nitidamente diferenciada em função do nível de ensino; 27,3%
dos estudantes, no ensino superior; 84,9%, no ensino médio; 89,5%, no
fundamental e 76,0%, no pré-escolar (PNAD, 2003).
O PROUNI como ação
afirmativa
As políticas
universalistas de democratização do ensino, orientadas pela lógica da oferta, a
despeito do reconhecido avanço na questão do acesso e da vinculação de
recursos, não lograram cumprir a promessa de tratar a todos igualmente e
têm alimentado uma forte tendência para a adoção de políticas
orientadas pela lógica da demanda, voltadas para o direito à diferença
como base do direito à igualdade.
O número de egressos do
ensino médio público, ainda bastante distante das metas nacionais,
aumentou consideravelmente no último decênio, composto agora por um
contingente maior de representantes dos extratos menos favorecidos da
sociedade. Nesse contexto, eleva-se o questionamento do princípio
de igualdade de oportunidades que pautou a expansão da escola pública por
meio de políticas homogeneizadoras que favoreceram grupos restritos de
portadores de privilégios econômicos, sociais e culturais.
Como já afirmado, a
disponibilidade de candidatos qualificados formalmente ao ensino superior é de
apenas 27% da população de 18
a 24 anos. Essa restrição fundamental se amplia quando
consideradas as 12 de camadas de renda mais baixa da população e o
segmento de não brancos (considerados aqui pretos, pardos e indígenas).
Quanto ao acesso ao ensino superior, segundo dados do PNAD/IBGE (2003),
apenas 5% dos jovens de 18
a 24 anos oriundos de famílias com renda per capita de
até um salário mínimo e 5% de não brancos chegam ao ensino superior.
Uma das idéias mestres da
reforma universitária, em processo, em vários países é a democratização
do acesso, entre outras medidas, por meio de ações afirmativas seja de caráter
racial, social ou de ambas. no âmbito do direito, a igualdade jurídica,
segundo a qual a lei deve ser igual para todos, é hoje confrontada com
experiências e estudos que demonstram sua insuficiência para, por si só, tornar
acessíveis aos indivíduos socialmente desfavorecidos as oportunidades de
que gozam os socialmente privilegiados.
No Brasil, políticas de
ação afirmativa ganharam destaque pela pressão de movimentos sociais, em
especial o movimento negro, com grande penetração social no país. Esses
movimentos exercem um esforço meritório no sentido de ampliar a inclusão
social no ensino superior e lutar não apenas pelo acesso, mas também pelo
acompanhamento e necessário apoio ao estudante dada a diversidade de
fatores responsáveis pela evasão. A reserva de cotas raciais para acesso
ao ensino superior, público ou privado, vem causando polêmica nos diversos
setores da sociedade brasileira, dos acadêmicos aos políticos,
dos juristas às organizações não-governamentais.
Quanto ao mérito para
acesso ao ensino superior, o PROUNI concede bolsas de estudos para alunos
que tenham se submetido ao Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM), com
avaliação igual ou superior a 50
pontos. Esses alunos
também deverão se submeter a uma seleção na IES, segundo seus próprios
critérios.
O PROUNI como prática
privatista; a utilização dos recursos públicos na iniciativa privada Ao
voltar-se para a solução do problema de escassez de vagas no ensino superior
através do incentivo à iniciativa privada, o PROUN resgata as relações entre
o público e privado, sobretudo no tocante ao financiamento da educação,
uma vez que se registra a transferência de recursos públicos para as
empresas privadas de ensino, mediante isenção de recolhimento de impostos
e tributos incidentes sobre receitas provenientes de atividades
desenvolvidas.
Esse mecanismo de financiamento público indireto para os
estabelecimentos de ensino superior privados tem sofrido resistências
daqueles que lutam por uma retomada dos investimentos na educação
superior pública, após décadas de seu reconhecido processo de
descapitalização. Consideram que os recursos que deixam de ser arrecadados
poderiam ser aplicados na oferta de vagas em instituições públicas em lugar
de comprar vagas ociosas do setor privado, oferecendo um serviço de
qualidade duvidosa. Para esses, o PROUNI representa uma medida de
recuperação financeira de IES que enfrentam queda na demanda
pelos serviços do ensino, quer pelo excesso de vagas criadas, quer pela
queda de rendimentos reais da população e o nível elevado de desemprego,
responsáveis pela inadimplência e desistência.
Como resposta, dirigentes
do MEC argumentam que o grau de evasão fiscal nesse nível de
atividades empresarial é tão elevado que o montante não arrecadado seria
irrisório comparado ao benefício que a ampliação do acesso no ensino
superior poderia oferecer.
Nesse sentido, o PROUNI é
divulgado pelo Governo Federal como uma iniciativa ainda tímida
de redistribuição indireta de renda, ao transferir recursos de isenção
fiscal para os estratos populacionais menos favorecidos, o que
dificilmente ocorreria de outro modo. Ao mesmo tempo, acena com medidas
de caráter estrutural como a ampliação de vagas e criação de novas
Universidades Federais, nas diferentes regiões do país.
No entanto, a questão que
não se cala é aquela que indaga sobre a qualidade do benefício distribuído
pelo PROUNI em nome de maior eqüidade social. Qual é efetivamente a
qualidade do ensino oferecido pelas IES privadas participantes do
Programa? Como assegurar um padrão mínimo de qualidade? Quais
as características e compromissos das IES envolvidas no PROUNI?
As expectativas colocadas
para a Universidade no projeto de desenvolvimento de uma
sociedade democrática e justa, ainda que inserida no mundo globalizado com
fortes determinantes do mercado, é a de uma instituição em que a formação
graduada, pós-graduada, a pesquisa e extensão são articuladas e orientadas
por princípios que denotem clara responsabilidade social. A opção por
privilegiar IES privadas, cuja maioria são faculdades ou centros
universitários, desobrigados da pesquisa e extensão, parece indicar uma
opção por flexibilizar e diversificar a oferta de estudos pós-secundários, de
menor custo e mais sensíveis às urgências do mercado.
Por outro lado, as ações
afirmativas, por definição, devem cumprir um período de vigência
determinado, enquanto perdurarem as condições que justificam sua criação.
No caso do PROUNI, o contrato de adesão tem validade de dez anos, ficando,
porém sujeita a IES ao monitoramento do Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Superior (SINAES), podendo seus cursos serem desvinculados do Programa
caso sejam considerados insuficientes por três avaliações consecutivas,
sendo redistribuídas as bolsas de estudos vinculadas.
Ao analisar o Programa,
do projeto à legislação, no aspecto da renúncia fiscal, CARVALHO
(2005) considera que a falta de sanções mais severas pelo descumprimento
das regras estabelecidas e o lapso temporal para a avaliação dos cursos
podem provocar uma acomodação de interesses em torno do afrouxamento do
aparato regulatório estatal e estimular comportamentos oportunistas de IES de
qualidade duvidosa. A autora ainda considera que há dúvidas quanto à
efetividade do caráter social do Programa uma vez que [....]a
população de baixa renda não necessita apenas de gratuidade integral ou
parcial para estudar, mas de condições que apenas as instituições
públicas, ainda, podem oferecer tais como: transporte, moradia estudantil,
alimentação subsidiada, assistência médica disponível nos hospitais universitários,
bolsas de pesquisa, entre outros.
Considerações finais
As análises e
considerações realizadas no corpo do presente trabalho ultrapassam em escopo
as indagações colocadas como objeto da pesquisa, qual seja, o impacto do
PROUNI nas IES e na vida pessoal e escolar dos alunos. Qual é o impacto da
adoção do PROUNI no que se refere ao currículo, à organização dos cursos,
à criação de instituições de apoio escolar? Quais os desdobramentos para o
aluno de sua inserção na universidade? Quais os problemas vivenciados
pelos alunos no cotidiano da vida universitária?
Em que medida a inserção
na universidade, por meio do PROUNI, propicia a permanência do aluno?
Essas são algumas das questões que constituem o pano de fundo do presente
projeto.
Constituem, contudo,
ainda que mereçam maior aprofundamento, referencial indispensável a uma
análise que pretende capturar a complexidade inerente a processos sociais
que se desenvolvem em momentos de grandes transformações como o atual. A
maioria das análises aponta para as limitações do
Programa, particularmente nos aspectos referentes à qualidade da formação
acadêmica oferecida aos jovens egressos do ensino médio e,
conseqüentemente, à grande possibilidade de se estar mais uma vez contribuindo
para alargar a distância social entre os diferentes segmentos da
sociedade. Contudo, não há como negar que o momento é de busca de
alternativas que permitam sair do imobilismo das constatações, momento
de oportunidade para se explorar o surgimento de novas formas de caráter
mais híbrido, que articulam práticas de regulação e de emancipação social.
Políticas de inclusão social no ensino superior são um desafio a
se analisar.
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