Conceitualizações
A cultura organizacional assume-se como um conceito essencial à
compreensão das estruturas organizativas. Segundo Infestas Gil (1991), aquela
permite relacionar e aplicar variadas noções que até há muito pouco tempo eram
consideradas fatores passivos: os valores, a qualidade de vida no local de
trabalho, a identidade. A cultura de uma organização será pois um conjunto de
características que a individualiza e a torna única perante qualquer outra.
Assume-se como um sistema de valores, expressos através de rituais, mitos,
hábitos e crenças comuns aos membros de uma instituição, que assim produzem
normas de comportamento genericamente aceites por todos. Para João Bilhim,
(1996), a cultura significa mais do que as normas ou os valores do grupo,
traduzindo-se sim numa resposta genérica aos problemas que podem surgir,
baseada em sucessos conseguidos perante situações passadas.
Naturalmente, a cultura organizacional está em constante formação e
aperfeiçoamento, adaptando-se às alterações no meio ambiente e aos distintos
problemas internos; todavia, os elementos chave estáveis na vida do grupo,
completamente assimilados, não sofrem alterações.
Na opinião de Sebastião Teixeira (1998), algumas características
traduzem a essência da cultura de uma organização, como sejam: a identificação
do funcionário mais com a empresa no seu todo, do que com a sua profissão ou
tarefa específica; a colocação de ênfase no grupo, organizando-se o trabalho
essencialmente com base em equipas, e não numa base individual; a focalização
nas pessoas, no sentido de serem tomados em consideração os efeitos das
decisões sobre os membros da instituição; a integração departamental, visível
na medida em que os diferentes departamentos ou unidades têm a possibilidade de
atuar de forma independente; o controle, analisando de que forma as regras e a
supervisão direta determinam a verificação do comportamento dos empregados; a
tolerância do risco, em que importa saber até que ponto os empregados são encorajados
a inovar e enfrentar o risco; os critérios de recompensa, visíveis na
atribuição de compensações em função de fatores como o desempenho (idealmente),
favoritismo, antiguidade...; a tolerância de conflitos com maior ou menor
espírito de abertura; a orientação para fins ou meios, em que se procura
descobrir se as preocupações essenciais da gestão dizem respeito aos
resultados, ou aos meios utilizados para os atingir; por último, a concepção de
sistema aberto – ou seja, a medida em que a organização está atenta às
modificações no ambiente externo, e atua em resposta às suas necessidades.
Segundo o autor, estas características que definem uma cultura
organizacional existem em qualquer instituição num maior ou menor grau de um
contínuo; será a avaliação de cada um dos aspectos que permitirá então obter a
imagem da cultura de uma determinada organização, e definir com clareza as suas
particularidades.
[...]
Razão de Ser
Como vimos anteriormente, na primeira metade do século as organizações
eram vistas sob critérios puramente econômicos. O seu reconhecimento como
realidade social vem possibilitar uma nova política de relações humanas, e os
estudos decorrentes nesta área levam à aceitação posterior da existência de uma
cultura própria em cada organização. Aquela desempenha uma função simbólica, ao
representar a realidade complexa que é a vida social de um conjunto de pessoas.
Assume também uma função identificadora, visto ser a referência principal de
pertença a um grupo ou uma sociedade. É igualmente importante na medida em que,
expressa através do comportamento de um indivíduo, possibilita a sua integração
no conjunto humano com o qual se identifica.
Um outro fator – não menos importante – releva a importância da gestão
da cultura nas organizações; o fato de, progressivamente, os locais de emprego
se terem vindo a tornar cada vez mais comunidades de vida, assumindo a função
de preencher o espaço deixado vazio por outras instituições, como a escola, a
igreja, associações ou grupos de residência. As comunidades de trabalho ganham
pois protagonismo na socialização dos indivíduos. Dotadas de linguagem e
identidade próprias, afastam-se da tradicional e redutora função de sistema
produtivo e assumem-se como sistema social vivo.
Se consideradas apenas locais de trabalho ou de passagem para os seres
humanos, as organizações tornam-se sistemas inviáveis; daí as preocupações
emergentes no sentido de introduzir qualidade de vida no trabalho, e o
investimento nos tempos livres dos funcionários. Tal como referem Camara et
al. (1998: 131), "com a desagregação dos grupos tradicionais, a
Empresa surge agora ao lado da família e da Escola como ponto-chave da
socialização. É na cultura da organização e no grupo que ela forma, que o
indivíduo vai reforçar a sua identidade social, contrapondo-a aos grupos
externos".
Referem ainda os autores que a cultura organizacional permite criar
nos membros de uma organização um sentimento de harmonia, visto todos se
sentirem portadores do mesmo conjunto genérico de valores, partilhando idéias
claras sobre quais os comportamentos aceitáveis ou inaceitáveis no contexto da
sua empresa. É assim facilitada a homogeneização de atitudes dos seus membros,
e o alinhamento destes em conformidade com a missão do organismo.
Esta idéia remete-nos de imediato para uma outra, que traduz a
potencialidade da cultura organizacional no sentido de distinguir aquela
instituição das demais, criando nos seus elementos um sentimento de pertença e
partilha de valores que os compromete com a sua tarefa, tendo em vista o bem
comum da instituição. "A cultura é também, como daqui resulta claro, um
mecanismo de orientação e controle que molda e guia as atitudes e
comportamentos dos empregados" (idem: 153). Este aspecto é
particularmente importante no caso dos novos funcionários, que, pela absorção
da cultura, conseguem ajustar-se e ser aceites como membros de pleno direito na
instituição.
Ainda a este propósito, refere Gomes (2000: 111-112) como funções
essenciais da cultura organizacional "o controle, a integração, a motivação,
o envolvimento, empenhamento ou implicação, a identificação, a «performance», o
sucesso ou a excelência organizacionais(...)".
[...]
Cultura ou Culturas?
[...]
“Toda a investigação e produção teóricas sobre cultura organizacional
assentam invariavelmente em duas perspectivas, que entendemos por bem
referenciar: uma, integradora, propõe a existência de uma cultura forte e
única, dominando toda a estrutura de forma coesa; outra, diferenciadora,
enfatiza a heterogeneidade existente no seio de qualquer instituição, propondo
a existência de um conjunto de subculturas que se entrecruzam no quotidiano
organizacional” (Gomes, 2000). Segundo este autor, no primeiro caso, estamos
perante uma perspectiva que entende a cultura como um elemento aglutinador das
diferentes partes constitutivas de uma organização, de tal forma que esta surge
como um pólo unitário e homogêneo, no qual todos pensam da mesma forma, lidam
com os mesmos problemas e adotam soluções idênticas; por outro lado, e
contrariamente, poder-se-á argumentar que a estrutura é plural, integra grupos
diferenciados, sendo portanto natural a existência de conflitualidade entre os
distintos grupos sócio-profissionais, originadora de diferentes interesses e
formas de interpretação e reação às situações.
Gomes entende desta forma que as posições antagônicas sobre o fenômeno
traduzem duas possibilidades: a remissão para o estudo da cultura das
organizações, ou por outro lado para o estudo da cultura nas organizações. Tal
significa que, no primeiro caso, se estuda a instituição no seu todo, no
contexto das suas relações como o meio envolvente. Falamos de cultura
organizacional no singular, situando a organização no seu relacionamento com o
meio exterior. No segundo caso, a unidade de análise são os grupos que compõem
cada instituição; os planos são aqui grupais ou individuais (departamentos,
equipas, categorias profissionais, ou mesmo cada indivíduo isoladamente). A
concepção predominante é claramente diferenciadora e pluralista: é a cultura de
grupos que é analisada, e daí a utilização da expressão "culturas
organizacionais".
Na realidade, estas perspectivas claramente distintas alicerçam-se em
diferentes realidades visíveis nas estruturas institucionais, o que torna
pertinente a questão de saber se se revela desejável a existência nas
organizações de uma cultura forte, única, integradora e homogeneizadora, ou,
inversamente, de uma cultura mais difusa, plural e heterogênea.
Sobre esta temática, é opinião de Camara et al. (1998) que a
existência de uma cultura forte e exclusivista em todos os sectores da
organização poderá revelar-se contraproducente, visto tender a centrar a
instituição no seu interior, sustentando uma visão rígida e inflexível
relativamente ao meio envolvente. Naturalmente, a exigência de resolução de
conflitos, e de gestão quotidiana, implicam a existência de uma cultura forte,
mas não eliminatória de estratégias particulares dos diversos grupos internos,
que se apóiam, isso sim, na cultura geral da organização, naquilo que é a
essência da sua identidade. "A cultura dominante expressa as normas,
valores e crenças essenciais a toda a organização e que são partilhados por um
número maior ou menor de membros. Quando se fala de cultura organizacional
está-se a referir à cultura dominante, à macro visão da cultura que confere à
organização a sua personalidade distinta." (Bilhim, 1996: 170).
Não será então coreto, segundo Camara et al., fazer a apologia
da existência de uma cultura única no seio de uma organização, mas sim de
"um mosaico cultural", particularidades que têm a sua origem em
objetivos específicos de cada sector, grupos profissionais ou distintos tipos
de relação com o trabalho. Defendem os autores que estas distinções culturais,
ao invés de desintegrarem ou fragmentarem a instituição, poderão atuar em seu
favor: organizações que adotam uma perspectiva pluralista de cultura agem em
conformidade com os anseios e expectativas do indivíduo moderno, e com o papel
social cada vez mais relevante que as instituições desempenham nas sociedades contemporâneas.
A visão de Ferreira et al. (1996: 318) relativamente a este
aspecto apresenta-se distinta: entendem os autores que, "mais importante
que o problema da homogeneidade cultural versus heterogeneidade, é a
necessidade de avaliar a complexidade dos problemas e o grau de ajuste das
soluções aos mesmos." Querem com isto significar que, em sua opinião, o
sucesso das instituições não se relaciona diretamente com a prevalência de
culturas singulares ou diferenciadoras, mas sim com a capacidade de resposta
rápida e adequada às exigências constantes do meio envolvente.
Cultura Organizacional e Cultura de Empresa
Não gostaríamos de encerrar estas breves páginas que tratam a cultura
nas organizações sem referenciar uma perspectiva para a qual João Freire (1993)
chama a atenção: as diferenças existentes entre aquilo que Duarte Pimentel
intitula de "cultura de empresa" e "cultura
organizacional". Freire refere, citando o autor, que, neste último caso,
"o sistema de representações centra-se sobre as estruturas, processos e
modos de funcionamento, visando as formas de atuação na organização." (idem:
197). Ou seja, não estamos na presença de uma cultura peculiar e própria de uma
empresa, mas apenas de mecanismos que regulam as relações sociais. Uma cultura
particular de empresa, por sua vez, implica a existência de projetos coletivos,
sentimento de pertença, e a aquisição, transmissão e partilha de uma mesma
cultura por todos os envolvidos. Freire refere que só nestas condições se
poderá considerar a introdução de processos sociais de inovação, sendo que o
papel da cultura de empresa pode ser sinergético na otimização de recursos, no
âmbito de uma estratégia de desenvolvimento da instituição.
Algum paralelismo com esta visão dos fatos poderá ser encontrado na análise
de Carvalho Ferreira et al.. Em Psicossociologia das Organizações,
os autores estabelecem distinções entre clima e cultura organizacionais.
Perspectivam para o primeiro uma aplicação prática, apresentando-o como uma
parte da cultura que, essa sim, configura os pressupostos fundamentais
desenvolvidos por grupos humanos no âmbito das organizações, por forma a
enfrentar os problemas de adaptação ao meio exterior e de integração interna.
Esses pressupostos, testados em diversas situações e considerados válidos, irão
então ser indicados aos novos membros, como modelos gerais a seguir perante
aqueles problemas.
[...]
Fonte
MATIAS, Ana Mafalda Portas. Cultura Organizacional. Disponível em:
<http://www.ipv.pt/forumedia/5/16.htm>. Acesso em: 10 abr. 2006.
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